D. Neuma desabafa:
A Mangueira não é mais a escola do nosso morro
Luta Democrática
03 de agosto 1976
Bernadette de Freitas
D. Neuma, filha do primeiro
presidente do Grêmio Recreativo
da Escola de Samba da Manguei-
ra, sócia nº 1 da escola, continua
morando no Morro da Manguei-
ra, mas está totalmente desligada
da diretoria da escola, que agora
tem Bira como seu presidente, e
Cartola, desde 1941 desligado
das atividades mangueirenses,
como um de seus assessores. “A
escola, agora, tem mais assosso-
res que sambistas”, comentou d.
Neuma.
Ela, que fundou o Departa-
mento Feminino da Escola de
Samba du Manguara e, durante
10 anos, foi sua presidente, per-
deu as eleições de junho para Zi-
ca, mulher do compositor Carto-
la.
presidente do Grêmio Recreativo
da Escola de Samba da Manguei-
ra, sócia nº 1 da escola, continua
morando no Morro da Manguei-
ra, mas está totalmente desligada
da diretoria da escola, que agora
tem Bira como seu presidente, e
Cartola, desde 1941 desligado
das atividades mangueirenses,
como um de seus assessores. “A
escola, agora, tem mais assosso-
res que sambistas”, comentou d.
Neuma.
Ela, que fundou o Departa-
mento Feminino da Escola de
Samba du Manguara e, durante
10 anos, foi sua presidente, per-
deu as eleições de junho para Zi-
ca, mulher do compositor Carto-
la.
Jurada de TV
Atualmente fazendo parte do
júri do programa “Um instante,
Maestro”, de Flávio Cavalcanti,
na TV-Sílvio Santos, d. Neuma
se disse perfeitamente à vontade
na televisão e ao ter que escolher
entre três músicas, no 1º e único
programa de que participou, pre-
frio “AveMaria No Morro”,
por gostar muito da letra, que
fala de coisas muito ligadas à sua
vida.
A primeira dama da Manguei-
ra confessou estar muito magoa-
da com Zica, sua amiga e colabo-
radora há tantos anos, que decla-
rou, no rádio e na TV, que a anti-
ga diretoria da escola não fez
nada além de róubar c afirma:
“roupa suja se lava em casa e se
ela tinha alguma reclamação a
fazer devia fazê-lo na assembléia
do Grêmio e não no ar, para pes-
sous desvinculadas da Manguei--
ra”.
CONTRA
No meio dos numerosos barra-
cos espalhados pelo Morro da
Mangueira ergue-se uma cons-
trução que se destaca do conjun-
to: é o Palácio do Samba, cons-
truído pela Cofrelar e que, na
“opinião de d. Neuma, o pessoal
da escola nunca vai conseguir
pagar, porque os juros e correção
monetária tornam a divida
maior a cada ano que passa. E
ela continua: “antes, o samba era
para o pessoal daqui, que ia para
os ensaios de tamanco e roupa
remendada, as crianças descalças
e com o narizinho escorrendo:
Agora não, a escola tá virando
clube de pula-pula, de gente fina
e o pessoal tem que pagar prá en-
trar. Sócio não paga, mas tam-
bém não pode entrar em todas as
festividades. Sou contra tudo is-
to. Ainda sou do tempo em que
escolu era para os moradores do
morro: a gente não pode ir a tea-
tro, cinema ou circo - os preços
são um absurdo - e ainda querem
nos tirar a nossa única diversão
grátis!”
RECREAÇÃO
Neuma está particularmente
desgostosa com o fato de terem
sido abandonados todos os tipos
de esporte, que antes eram prati-
cados na escola. E justifica seu
ponto de vista: “formamos um
grêmio recreativo e devemos in-
centivar a prática do esporte, em
todas as suas modalidades, por-
que isto evita que as crianças da-
qui caiam na perdição. Todos os
anos participávamos dos “Jogos
Infantis” e dos “Jogos da Prima-
vera” (estamos incluídos na série
“Especiais” de clubes) e treináva-
mos concorrentes até para os
concursos de esgrima e jogo de
damas e xadrez - vários clubes de
futebol nos emprestavam mate-
rial e treinadores. A gente orga-
nizava também corridas de bici-
cletas, velocípedes, tricícios, e vá-
raias outras atividades, mas ago-
ra está tudo abandonado e até a
Escola de Samba Mirim, que se
apresentava gratuitamente nas
escolas (ficavam felizes só em sa-
ber que iam ganhar um lanche)
não tem recebido ihcentivo.
UMA FAMÍLIA
Conversando com d. Neuma,
em sua casa probremente mobi-
liada e que, no entanto, é uma
das poucas construções de tijo-
los pudemos imaginar a probeza
em que vivem os demais habitan-
tes do Morro da Mangueira. E é
a ex-presidente do Departamento
Feminino da Escola de Samba
quem nos conta: “estão falando
que a gente roubou é não fez
nada pela escola. Você, que está
vendo onde eu moro, pode me di-
zer o que fiz com o dinheiro rou-
bado? Mas eu gosto daqui, a mi-
nha vida se resume a este pedaço
do mundo e, o que é mais impor-
tante, somos uma família muito
unida, todos nós que moramos
na Mangueira. Antigamente (e
ainda existem algumas vendas
que fazem isso), ninguém aqui fi-
cava sem tomar o seu café com
pão porque havia uma quitanda,
que pertencia ao pai do nosso 2º
tesoureiro - que também acusam
de ladrão - que vendia pedaços
de pão com manteiga, duas ou
três colheres de pô de café, 100
gramas de feijão. Hoje em dia,
qual o comerciante que faz isso?”
NÃO GOSTA
Afirmando não gostar da voz
de Clementina de Jesus (gosto de
ouvir a Maria Creuza cantar,
com uma voz limpa, suave), d.
Neuma diz que o mal das pes-
soas, atualmente, é querer ser ar-
tista. E continua:
- Cartola, Carlos Cachaça e
Nelson Cavaquinho são compo-
sitores espetaculares, eu adoro as
músicas deles. Mas, pelo amor de
Deus, não me digam que eles são
cantores porque com isto eu não
concordo. Nenhum deles tem voz
bonita. São grandes composito-
res, quanto a isto não há dúvidas..
E agora, este problema: os caras
fazem as músicas e não dão pra
ninguém gravar. À Maria Creuza
mesmo está querendo lançar um
LP, mas não encontra quem
queira lhe dar canções para gra-
var. A Mangueira, no momento,
está cheia de gente querendo fi-
car famosa e a escola não é mais
frequentada pelos moradores do -
morro, mas por pessoas de fora,
que de repente resolveram que o
samba é moda”.
FILHOS
Ainda muito triste por ter per-
dido uma neta de seis anos há
poucos dias, d. Neuma, que está
com 54 amos é há 33 mora no
Morro da Mangueira, está "re-
Atualmente fazendo parte do
júri do programa “Um instante,
Maestro”, de Flávio Cavalcanti,
na TV-Sílvio Santos, d. Neuma
se disse perfeitamente à vontade
na televisão e ao ter que escolher
entre três músicas, no 1º e único
programa de que participou, pre-
frio “AveMaria No Morro”,
por gostar muito da letra, que
fala de coisas muito ligadas à sua
vida.
A primeira dama da Manguei-
ra confessou estar muito magoa-
da com Zica, sua amiga e colabo-
radora há tantos anos, que decla-
rou, no rádio e na TV, que a anti-
ga diretoria da escola não fez
nada além de róubar c afirma:
“roupa suja se lava em casa e se
ela tinha alguma reclamação a
fazer devia fazê-lo na assembléia
do Grêmio e não no ar, para pes-
sous desvinculadas da Manguei--
ra”.
CONTRA
No meio dos numerosos barra-
cos espalhados pelo Morro da
Mangueira ergue-se uma cons-
trução que se destaca do conjun-
to: é o Palácio do Samba, cons-
truído pela Cofrelar e que, na
“opinião de d. Neuma, o pessoal
da escola nunca vai conseguir
pagar, porque os juros e correção
monetária tornam a divida
maior a cada ano que passa. E
ela continua: “antes, o samba era
para o pessoal daqui, que ia para
os ensaios de tamanco e roupa
remendada, as crianças descalças
e com o narizinho escorrendo:
Agora não, a escola tá virando
clube de pula-pula, de gente fina
e o pessoal tem que pagar prá en-
trar. Sócio não paga, mas tam-
bém não pode entrar em todas as
festividades. Sou contra tudo is-
to. Ainda sou do tempo em que
escolu era para os moradores do
morro: a gente não pode ir a tea-
tro, cinema ou circo - os preços
são um absurdo - e ainda querem
nos tirar a nossa única diversão
grátis!”
RECREAÇÃO
Neuma está particularmente
desgostosa com o fato de terem
sido abandonados todos os tipos
de esporte, que antes eram prati-
cados na escola. E justifica seu
ponto de vista: “formamos um
grêmio recreativo e devemos in-
centivar a prática do esporte, em
todas as suas modalidades, por-
que isto evita que as crianças da-
qui caiam na perdição. Todos os
anos participávamos dos “Jogos
Infantis” e dos “Jogos da Prima-
vera” (estamos incluídos na série
“Especiais” de clubes) e treináva-
mos concorrentes até para os
concursos de esgrima e jogo de
damas e xadrez - vários clubes de
futebol nos emprestavam mate-
rial e treinadores. A gente orga-
nizava também corridas de bici-
cletas, velocípedes, tricícios, e vá-
raias outras atividades, mas ago-
ra está tudo abandonado e até a
Escola de Samba Mirim, que se
apresentava gratuitamente nas
escolas (ficavam felizes só em sa-
ber que iam ganhar um lanche)
não tem recebido ihcentivo.
UMA FAMÍLIA
Conversando com d. Neuma,
em sua casa probremente mobi-
liada e que, no entanto, é uma
das poucas construções de tijo-
los pudemos imaginar a probeza
em que vivem os demais habitan-
tes do Morro da Mangueira. E é
a ex-presidente do Departamento
Feminino da Escola de Samba
quem nos conta: “estão falando
que a gente roubou é não fez
nada pela escola. Você, que está
vendo onde eu moro, pode me di-
zer o que fiz com o dinheiro rou-
bado? Mas eu gosto daqui, a mi-
nha vida se resume a este pedaço
do mundo e, o que é mais impor-
tante, somos uma família muito
unida, todos nós que moramos
na Mangueira. Antigamente (e
ainda existem algumas vendas
que fazem isso), ninguém aqui fi-
cava sem tomar o seu café com
pão porque havia uma quitanda,
que pertencia ao pai do nosso 2º
tesoureiro - que também acusam
de ladrão - que vendia pedaços
de pão com manteiga, duas ou
três colheres de pô de café, 100
gramas de feijão. Hoje em dia,
qual o comerciante que faz isso?”
NÃO GOSTA
Afirmando não gostar da voz
de Clementina de Jesus (gosto de
ouvir a Maria Creuza cantar,
com uma voz limpa, suave), d.
Neuma diz que o mal das pes-
soas, atualmente, é querer ser ar-
tista. E continua:
- Cartola, Carlos Cachaça e
Nelson Cavaquinho são compo-
sitores espetaculares, eu adoro as
músicas deles. Mas, pelo amor de
Deus, não me digam que eles são
cantores porque com isto eu não
concordo. Nenhum deles tem voz
bonita. São grandes composito-
res, quanto a isto não há dúvidas..
E agora, este problema: os caras
fazem as músicas e não dão pra
ninguém gravar. À Maria Creuza
mesmo está querendo lançar um
LP, mas não encontra quem
queira lhe dar canções para gra-
var. A Mangueira, no momento,
está cheia de gente querendo fi-
car famosa e a escola não é mais
frequentada pelos moradores do -
morro, mas por pessoas de fora,
que de repente resolveram que o
samba é moda”.
FILHOS
Ainda muito triste por ter per-
dido uma neta de seis anos há
poucos dias, d. Neuma, que está
com 54 amos é há 33 mora no
Morro da Mangueira, está "re-
signada com a vontade de Deus”,
ainda que, bem lá no fundo, ache
que mais razoável se a mor-
te levasse sua sogra, que já está
ainda que, bem lá no fundo, ache
que mais razoável se a mor-
te levasse sua sogra, que já está
com quase 100 anos, ao invés de
uma criança que mal começara a
viver. Com três filhos adultos, a
caçula tem 27 anos, ela já crious
muitas crainças e, atualmente,
tem três filhos adotivos em casa.
- Não posso apanhar outras
crianças para criar, porque a
pensão do meu marido, sou viú-
va, é Cr$ 250,00 e isto, hoje em
dia, não dá pra nada, não é mes-mo?
Muito conhecida na Manguei-
ra, onde todos gostam dela, d.
Neuma fala da solidariedade dos
habitantes do morro: “no enterro
de minha neta, a avenida aqui em
frente ficou totalmente tomada
de gente. Também no dia do meu
de minha neta, a avenida aqui em
frente ficou totalmente tomada
de gente. Também no dia do meu
casamento, pude ter certeza da
amizade que une as pessoas aqui
na Mangueira. Meus cunhados
haviam prometido fazer a festa e,
na véspera, desistiram. Foi en-
tão que todo mundo me ajudou.
Uns mataram porcos, outros fi-
zeram doces, uma confeiutaria me
deu duas tortas enormes e as
sim a festa do meu casamento
foi uma beleza”.
A sócia nº 1 da Escola de Sam-
ba da Mangueira, que tem 63 afi-
lhados, entre eles o filho da fa-
mosa passista Gigi, disse que sus.
escola vai ser a quinta «
este ano e o tema já foi escolhido:
“estou desligada da administra-
cão, mas pretendo colaborar de
todas as formas para que a Man-
gueira seja a vencedora do car-
naval de 77.”
sim a festa do meu casamento
foi uma beleza”.
A sócia nº 1 da Escola de Sam-
ba da Mangueira, que tem 63 afi-
lhados, entre eles o filho da fa-
mosa passista Gigi, disse que sus.
escola vai ser a quinta «
este ano e o tema já foi escolhido:
“estou desligada da administra-
cão, mas pretendo colaborar de
todas as formas para que a Man-
gueira seja a vencedora do car-
naval de 77.”
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